sábado, 7 de março de 2015

PAPO COM O PACIENTE: RELAÇÃO ENTRE FRATURAS DE COLUNA VERTEBRAL E POSSÍVEIS SEQUELAS

RESPOSTAS PARA PACIENTES:



Esses dias eu recebi via inbox uma pergunta de um seguidor do blog sobre fratura de coluna vertebral. Na mensagem dizia que sua esposa havia sofrido uma fratura de uma das vértebras lombares e vinha mantendo normalmente os movimentos das pernas. Sua aflição era saber se ela poderia ter algum tipo de paralisia.

Venho reparando em meus contatos com pacientes que esta é uma dúvida muito frequente, a relação entre as fraturas de coluna e uma possível sequela neurológica. Por isso resolvi fazer um breve texto tentando esclarecer alguns pontos para os pacientes.

As sequelas neurológicas, também conhecidas popularmente por paralisias, ocorrem quando o trauma na coluna atinge a medula espinhal, uma estrutura neurológica semelhante a um cabo de transmissão de energia, localizada no interior da coluna e que conecta o cérebro aos nossos nervos, que por sua vez se conectam com os músculos, órgãos internos e a pele. A medula transmite todas as informações relacionadas à sensibilidade e à motricidade entre o corpo e o cérebro. Geralmente essas lesões são causadas por compressões devido a deslocamentos de estruturas ósseas, em consequência das modificações na anatomia local causadas pela dissipação da energia cinética.  

O acometimento medular pode ocorrer ou não no contexto de um traumatismo de coluna. Uma vez ocorrendo, as alterações neurológicas podem ser transitórias ou permanentes, sendo essas últimas consideradas sequelas.

Existem inúmeras variáveis que envolvem as fraturas de coluna como por exemplos localização, se cervical, torácica ou lombar. Outras incluem o tipo específico da fratura, o mecanismo do trauma, a preservação ou não dos ligamentos, o tempo do diagnóstico, o tempo de intervenção cirúrgica e também a idade do paciente. É sempre bom lembrar que ligamentos são os elementos de tecido conjuntivo que unem as peças ósseas, dessa forma eles mantêm a coluna vertebral estável. Costumo comparar a lesão de um ligamento na coluna com o dano de um pilar de um edifício, ambos causam instabilidade na estrutura de sustentação.

As fraturas cervicais ocorrem em diversos tipos de traumas, desde os com grande impacto como acidente moto ciclístico e quedas de grandes alturas, como também pode ocorrer por traumas na cabeça devido a um vetor de força axial como, por exemplo, mergulhos em água rasa.  Quando ocorre o acometimento da medula nesses casos o paciente geralmente cursa com tetraplegia, quanto mais alto for a vértebra acometida mais grave será a tetraplegia, podendo em alguns casos o paciente ter um comprometimento também dos músculos que executam a respiração e necessitar de uma traqueostomia conectada a um respirador 24 horas por dia, como os exemplos do ator Cristopher Reeve e da estudante Luciana, atingida em uma faculdade no Rio de Janeiro. Dependendo do grau de acometimento da medula, a perda das funções motoras pode vir acompanhada de perdas das funções sensitivas também. Isso significa que do nível da lesão para baixo o paciente não sente absolutamente nada, nem tato, nem dor, nem temperatura. Determinados tipos de tetraplegia podem vir acompanhados de disfunção no sistema nervoso autonômico, causando assim sintomas como redução da frequência cardíaca, queda na pressão arterial e até mesmo uma ereção involuntária do pênis, não significando qualquer tipo de excitação sexual. Em algumas situações dependendo da lesão medular e do tempo até a descompressão cirúrgica, o paciente poderá ou não recuperar parte dos movimentos. Quando não ocorre o acometimento da medula o paciente pode sentir apenas dor no pescoço

As fraturas de coluna torácica geralmente são graves e na maioria das vezes cursam com ruptura das estruturas ligamentares causando um deslocamento excessivo das vértebras (luxação) e acometimento da medula espinhal, o que culmina em uma paraplegia, na maioria dos casos permanentes, porém alguns podem recuperar parcialmente a força. É difícil, porém ocorrem fraturas de coluna torácica com a medula intacta e dessa forma sem acometimento motor ou sensitivo.

O acometimento neurológico nas fraturas da coluna lombar também ocorre, porém não tão frequentemente quantos os anteriores, mas pode haver lesão de uma estrutura neural conhecida como cauda equina, que nada mais é do que o agrupamento de vários nervos que inervam a região pélvica e membros inferiores. Uma lesão de cauda equina pode resultar em sequelas desagradáveis como incontinência ou retenção urinária, perda da sensibilidade na região da genitália, disfunção sexual e até mesmo fraqueza em membros inferiores. Na prática, a grande maioria das fraturas de coluna lombar evolui apenas com dor, permanecendo o paciente com as funções motoras e sensitivas preservadas, porém pode ser necessária cirurgia para estabilização (artrodese), pois o movimento excessivo a longo prazo pode causar perda das funções neurológicas (força muscular e sensibilidade), ou até mesmo deformidade (cifose).

As fraturas de coluna devem ser sempre evitadas porque depois de estabelecido o dano a uma estrutura neurológica as sequelas podem ser irreversíveis.


Dr. Bernardo de Andrada

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